Unidade Artificial: Quando os Inimigos se Dão as Mãos

Diário de um Católico na Contrarrevolução — Parte 2

Nos últimos anos do pontificado de Francisco, especialmente à medida que sua saúde começou a declinar, tornou-se perceptível uma reorganização das forças dentro da própria revolução conciliar. Como bem nota Everardo Wanderlei Uavniczak, dois blocos passaram a se delinear com maior nitidez:

  • De um lado, os progressistas assumidamente modernistas, que defendem uma ruptura aberta com a Tradição e sonham com uma nova Igreja sinodal, líquida, inclusiva, eclesiasticamente LGBT friendly.
  • Do outro, os defensores da hermenêutica da continuidade, os filhos da Nouvelle Théologie, que juram de pés juntos que o Vaticano II está em plena harmonia com a doutrina de sempre — mesmo diante de décadas de destruição litúrgica, catequética e moral.

Ambos brigavam, é verdade, mas como irmãos disputando herança. Sob o pontificado de Francisco, suas diferenças foram abafadas pela conveniência. Agora, sob Leão XIV, elas parecem simplesmente dissolvidas. A guerra fria entre progressistas e conservadores conciliares deu lugar a uma nova aliança: ambos querem calar a crítica tradicionalista.

A lógica é simples: os únicos que realmente denunciam os erros estruturais do Vaticano II são os tradicionalistas — aqueles que veem nas ambiguidades conciliares o início da apostasia silenciosa. Esses são os alvos agora.

Enquanto os herdeiros de Rahner e von Balthasar abraçam a agenda sinodal, os discípulos de Ratzinger fazem cara de sensatos e pedem “prudência” — mas, no fim, todos se unem no mesmo refrão: “Não critiquem o Concílio”.

O novo inimigo comum: a Tradição viva

O que os progressistas e os “conservadores domesticados” chamam de “extremismo” é, na verdade, a fé de sempre. O que chamam de “cisma” é a intransigente fidelidade a Cristo Rei, à Missa de sempre e ao Magistério perene.

Para neutralizar essa resistência, a estratégia é clara:

  • rotular tudo como sedevacantismo,
  • fingir que todo tradicionalista é “divisivo”,
  • acusar de desobediência todo aquele que, com amor à Igreja, rejeita as heresias disfarçadas de pastoral.

O caso da perseguição a Dom Tomás de Aquino e à FSSPX é apenas o mais visível. Mas o mesmo veneno já corre nas veias da Igreja institucional. Basta você dizer que a Fiducia Supplicans é herética, ou que a Missa Nova foi uma ruptura litúrgica escancarada — e pronto: o rótulo vem.

Você não é mais um católico fiel.

Você é “problemático”, “radical”, “fora da comunhão”.

O erro é tolerado. A verdade, censurada

Nos gabinetes episcopais, nos seminários, nas conferências, a nova palavra de ordem é “moderação”. Mas o que se esconde por trás dessa moderação é o desejo de eliminar qualquer ligação com o passado católico.

A Missa de sempre é tratada como perigo.

Os santos de sempre, como ultrapassados.

A doutrina de sempre, como obstáculo ao diálogo.

E enquanto os modernistas dançam ao redor do altar Versus Populum, os padres fiéis à Tradição são marginalizados, transferidos, silenciados ou expulsos.

A crise é doutrinária, não apenas disciplinar

Estamos diante de um ponto de inflexão. Já não se trata apenas de liturgia, mas de fé. Já não se trata apenas de estilos e preferências, mas da própria identidade católica.

Aqueles que ousam apontar que o rei está nu — que o Vaticano II foi ambíguo, que a Missa Nova é protestantizada, que a sinodalidade é uma bomba-relógio teológica — são colocados na mesma cela dos cismáticos.

E tudo isso sob o pretexto de uma “unidade” que, na prática, é a rendição total ao erro.

Resistir com lucidez, com firmeza e com caridade

Diante desse cenário, o católico consciente deve manter a calma, mas jamais a conivência. É hora de dizer com todas as letras: não vamos nos calar.

O Papa Leão XIV pode tentar restaurar a aparência de ordem, mas sem a Verdade, será tudo uma farsa diplomática. E as almas continuarão sendo levadas ao abismo.

Como nos tempos de Santo Atanásio, os fiéis da Tradição serão cada vez mais marginalizados. Mas isso não é motivo para desânimo. Pelo contrário: é um selo de autenticidade.

Por um Católico consciente e atento ao cenário eclesial atual no Brasil