A Última Procissão

 

Os números não mentem. O Censo 2022 é claro como água benta em pia batismal: o catolicismo está em queda. O Brasil, que já foi orgulho de Roma e trono da piedade popular, agora reza mais baixo. Menos fiéis, menos jovens, menos voz.

O gigante acordou, mas não foi o Católico — foi o evangélico, foi o sem religião, foi o “crente” de esquina, o espiritualista que monta altar com cristal e incenso. O Católico... cochila. 

E talvez o problema esteja aí: o catolicismo brasileiro dormiu no conforto da hegemonia, confiou que ser “maioria” era o mesmo que ser “presente”. Enquanto isso, o povo seguiu seu caminho. Saiu da missa, mas não saiu da fome. Procurou milagre, não encontrou. Quis sentido, só ouviu silêncio.

A fé do povo nunca foi racional, foi sempre de romaria e lágrima, de promessa amarrada no pé de santo. Mas a Igreja virou estrutura. Falou latim jurídico enquanto o povo pedia “Pai nosso” com pão. O púlpito subiu tanto que perdeu o chão. O templo ficou bonito, mas a periferia da alma ficou vazia.

O Censo mostra: os jovens não são mais Católicos. Nem por tradição, nem por culpa, nem por conveniência. O Catolicismo, que batizou até o IBGE em 1872, agora vê os batizados irem embora. Não porque odiaram a Igreja — mas porque ela deixou de ser casa.

O que está em queda não é só um número. É uma cultura, uma forma de estar no mundo, um ritmo de sino ao entardecer. É o cheiro de vela, o joelho no chão, o terço que virou herança da avó e não prática do neto. Estamos perdendo a “Catolicidade” do cotidiano, e não adianta gritar dogma se ninguém mais escuta.

A Igreja ainda é maior. Mas isso agora é só estatística. E estatística não salva. Salva a caridade. Salva a presença. Salva o escândalo da encarnação — esse Deus que se sujou de pó e suor. Se o Catolicismo quiser parar de cair, vai ter que descer. Descer das cátedras, das conferências e até dos palanques. E entrar de novo nas casas, não como juiz, mas como hóspede.

Não se trata de concorrer com evangélicos. Muito menos de tentar “seduzir” jovens com marketing. Se trata de voltar a ser evangelho — boa nova, carne que vibra, fé que chora com quem chora. Senão, o catolicismo será lembrança, museu, saudade.

O Brasil é ainda Católico no papel, mas cada vez menos no coração. E talvez seja hora de a Igreja fazer um exame de consciência — não com fórmulas de confissão, mas com a coragem de perguntar: por que tantos se foram? E, mais ainda: por que tantos ficaram e não foram ouvidos?

Se houver arrependimento, haverá conversão. E se houver conversão, haverá de novo a procissão.

Mas desta vez, não será de velas. Será de gente viva, de fé encarnada, de Igreja com cheiro de povo. E isso, sim, pode mudar o Censo — mas antes, precisa mudar o centro.

Por seu Irmão Carmelita Secular da Antiga Observância B.