O Silêncio do Sacrifício Esquecido

Diário de um Católico na Contrarrevolução — Parte 27

A aurora ainda se erguia sobre a cidade quando cheguei à pequena capela que, milagrosamente, resistira à maré de modernismos que engolira tantas outras. O vento soprava entre as colunas antigas, e, ao atravessar o portal de madeira, senti o peso sagrado de séculos sobre meus ombros. Ali, nada havia de compromissos sociais, de “acolhimento inclusivo” ou de adaptações racionais que prometem aproximar o homem de Deus enquanto o afastam de Sua majestade. Ali, a Igreja permanecia íntegra, e o silêncio era um cântico mais alto que qualquer conversa mundana.

Não posso deixar de comparar essa fidelidade silenciosa com o espetáculo desastrado que se tornou a liturgia moderna: uma missa que, em sua ânsia de ser compreendida e agradável, diluiu o sacrifício em cantos pop, luzes coloridas e gestos improvisados. A realidade é crua: o homem moderno quer sentir conforto, não se confrontar com Deus. E Deus não se molda ao nosso conforto. O Novus Ordo, com todas as suas boas intenções — ou melhor, com todas as suas intenções utilitárias —, esqueceu o princípio mais básico da Tradição: a liturgia não existe para nos agradar, mas para nos transformar.

Na Missa Tridentina que assisti hoje, cada gesto, cada genuflexão, cada elevação do cálice era um lembrete do que perdemos e do que devemos recuperar. Não há improvisação, não há distração; apenas a verdade do sacrifício e a entrega de uma humanidade que sabe sua pequenez diante do Criador. Quando o padre recitou as palavras consagratórias, senti que toda a minha vida mundana — preocupações, ambições, banalidades — se dissolvia no espaço sagrado entre o céu e a Terra. E percebi, de forma quase dolorosa, que essa experiência é hoje um luxo raro, quase subversivo, porque a modernidade ensinou que sentir Deus assim é antiquado, restritivo, politicamente incorreto.

Não posso ignorar o contraste entre a Tradição e os sinais do modernismo: comunhão distribuída com pressa, leituras escolhidas por conveniência pastoral, cores alegres que tentam mascarar o mistério da morte e do pecado. Lembro-me de Santo Tomás de Aquino, que nos exorta a não subestimar a força da beleza na liturgia, porque ela nos eleva à contemplação do Divino. E vejo que, ao tentar “adaptar” a liturgia à mentalidade moderna, o homem não se aproxima de Deus — ele se afasta.

Exemplos concretos saltam à mente: a recente “reforma” dos salmos, que transformou o louvor em comentário filosófico; a inversão de dias litúrgicos, como Finados sendo jogado num domingo, como se a memória dos mortos pudesse se misturar à alegria da Ressurreição sem escândalo; a perda do costume das Missas dos Anjos para crianças batizadas, onde se celebrava o triunfo do Céu sobre a tragédia humana. Cada mudança parece pequena isoladamente, mas juntas formam um quadro de confusão, onde a clareza da verdade é diluída pelo verniz do bem-intencionado utilitarismo.

E, no entanto, não há desesperança. Enquanto a tradição sobreviver, mesmo em pequenos santuários, há luz. Vi jovens, com olhos curiosos e alma sedenta, ouvindo cânticos em latim e sentindo o peso do silêncio sagrado. Vi pais consolando filhos com histórias de santos que viveram e morreram fiéis, que não conheceram a misericórdia diluída da modernidade, mas confiaram na verdade crua e completa de Deus.

A conclusão é simples e firme: a Igreja não é um organismo que se adapta ao espírito do tempo; é uma fortaleza que resiste ao tempo. Cada missa tridentina, cada canto em latim, cada gesto preciso é um ato de fidelidade heroica. A modernidade é efêmera, e suas conquistas são pó diante da eternidade. Mas a Tradição permanece. E enquanto houver aqueles que escutam, olham e se deixam moldar pelo mistério sagrado, a Igreja não apenas sobrevive — ela triunfa, silenciosa, firme e radiante.

Que cada católico hoje lembre: resistir não é apenas uma escolha estética ou intelectual, mas uma declaração de fé. E no fim, a única vitória que importa é a do Céu. Aleluia.

Por um Católico consciente e atento ao cenário eclesial do Brasil e do Mundo.