Estas famosas orações em honra à Paixão de Cristo muito
provavelmente não foram escritas por Santa Brígida. Mas a espiritualidade de
sua Ordem está aqui, e o valor catequético e penitencial desta devoção
permanece em nossos dias.
As quinze orações a seguir, atribuídas a S. Brígida da
Suécia (1303-1373), muito provavelmente foram escritas por místicos da sua
Ordem, no século XV. Foram publicadas inúmeras vezes ao longo dos séculos, com
variação considerável nos textos e até mesmo na ordem das invocações.
Constituem, em si mesmas, uma meditação piedosa
sobre os mistérios da Paixão e Morte de Cristo. Eram bastante populares
durante a Baixa Idade Média, sendo item frequente nos manuais de oração da
época. Cumprem um duplo propósito: catequético, instruindo as
pessoas nos episódios mais importantes da vida de Nosso Senhor, e penitencial,
excitando-lhes o amor a Deus e o arrependimento dos próprios pecados.
Em muitos lugares estas preces estão associadas a uma
lista de promessas supostamente reveladas a S. Brígida quando de sua
visita à Basílica de São Paulo Fora dos Muros, em Roma. As tais promessas
listam uma série de incríveis benefícios, que seriam concedidos a quem
recitasse estas orações todos os dias ao longo de um ano, e incluem a
libertação de 15 almas dos entes queridos do Purgatório e a conversão de 15
pecadores da própria família. A verdade, porém, é que essas promessas
jamais foram feitas a S. Brígida e tampouco têm qualquer aprovação eclesiástica
que seja.
É muito de se lamentar que essas promessas ainda constem em
livros de oração nos nossos dias, pois a própria Congregação do Santo Ofício
proibiu, em 1954, a sua publicação [1]. Mas, ainda que não houvesse uma censura
a essas promessas vinda de Roma, o conteúdo delas é, de fato, arbitrário e
fantástico demais para ser credível. Não temos dúvidas de que abundantes
frutos espirituais podem ser colhidos da leitura e meditação das linhas abaixo,
mas promessas como as que circulam, associadas a estas orações, terminam
transformando em superstição o que deveria ser antes um
convite ao fervor na oração, à conversão interior e ao apostolado com as
pessoas mais próximas de nós.
A tradução abaixo foi feita por nossa Equipe a partir do
texto em latim encontrado na edição de 1670 do livro Paradisus Animæ
Christianæ, de Jacob Merlo Horst, e que também pode ser acessado no
site Preces Latinæ.
Lembrai-vos da tristeza e da amargura que, pelo vosso
testemunho, tivestes em vossa Alma, quando, na Última Ceia, entregastes aos
vossos discípulos o vosso Corpo e Sangue, lavastes-lhes os pés e, consolando-os
docemente, predissestes vossa iminente Paixão.
Lembrai-vos de todo o tremor, da angústia e da dor que em
vosso delicado Corpo, antes da Paixão de vossa Cruz, suportastes quando, após
vossa tríplice oração e o suor de Sangue, fostes traído por Judas, vosso
discípulo; preso pela gente escolhida; acusado por falsas testemunhas;
injustamente julgado por três juízes; condenado, embora inocente, na cidade
eleita, no tempo pascal, na florida juventude de vosso Corpo; despido da vossa
própria veste e coberto de vestes alheias; esbofeteado; tivestes vossos olhos e
rosto cobertos e fostes espancado, preso à coluna, flagelado, coroado de
espinhos, com uma cana ferido na cabeça e lacerado com inumeráveis outras
calúnias.
Dai-me, Senhor Deus, eu vo-lo peço, pela memória dessas
paixões antes de vossa Cruz, uma verdadeira contrição antes de minha morte, uma
pura Confissão, uma digna satisfação e a remissão de todos os pecados. Amém.
— Pai-Nosso, Ave-Maria, Glória.
Oração II. — Ó Jesus, criador do mundo, a quem
nenhuma dimensão pode compreender, que abarcais a Terra com um palmo:
recordai-vos de vossa amaríssima dor, que suportastes quando os judeus pregaram
vossas santíssimas mãos à Cruz com pregos embotados e, a fim de perfurar vossos
delicadíssimos pés, como não lhes fosse o bastante, acrescentaram dor sobre dor
às vossas chagas, e assim cruelmente vos distenderam e estenderam pelos braços
de vossa Cruz, para que se dissolvessem os vínculos dos vossos membros.
Eu vos imploro, pela memória desta sacratíssima e amaríssima
dor na Cruz, que me deis o vosso temor e amor. Amém. — Pai-Nosso, Ave-Maria, Glória.
Oração IV. — Ó Jesus, verdadeira liberdade dos
anjos, paraíso de delícias, lembrai-vos da tristeza e do horror que
suportastes, quando todos os vossos inimigos, quais leões ferocíssimos,
puseram-se ao vosso redor e, com bofetadas, cusparadas, lacerações e outras
penas inauditas, vos maltrataram.
Por estas penas e por todas as palavras contumeliosas e os
duríssimos tormentos com que vos afligiram, Senhor Jesus Cristo, todos os
vossos inimigos, eu vos imploro que me livreis de todos os meus inimigos,
visíveis e invisíveis, e me deis chegar, à sombra de vossas asas, à perfeição
da salvação eterna. Amém. — Pai-Nosso, Ave-Maria, Glória.
Oração V. — Ó Jesus, espelho da claridade
eterna, lembrai-vos daquela tristeza que tivestes quando, no espelho de vossa
sereníssima majestade, vistes a predestinação dos eleitos, que se haviam de
salvar pelos méritos de vossa Paixão, e a reprovação dos maus, que pelos seus
deméritos se haviam de condenar, e pelo abismo de vossa piedade, com que vos
compadecestes de nós, pecadores e desesperados, e que manifestastes ao ladrão
na Cruz, dizendo: “Hoje estarás comigo no paraíso”, rogo-vos, piedoso Jesus,
que tenhais misericórdia de mim na hora de minha morte. Amém. — Pai-Nosso, Ave-Maria, Glória.
Oração VI. — Ó Rei amável e amigo todo
desejável, lembrai-vos daquela tristeza que tivestes quando, nu e miserável,
pendestes na Cruz, e todos os vossos amigos e conhecidos se voltaram contra
vós, e não encontrastes ninguém que vos consolasse, além de vossa dileta Mãe,
de pé na amargura de sua alma fidelíssima a vós, que confiastes ao vosso
discípulo, dizendo: “Mulher, eis aí o teu filho”.
Rogo-vos, piíssimo Jesus, pela espada de dor que transpassou
a alma dela, que vos compadeçais de mim em todas as minhas tribulações e
aflições, corporais e espirituais, e dai-me a consolação no tempo da tribulação
e na hora de minha morte. Amém. — Pai-Nosso, Ave-Maria, Glória.
Oração VIII. — Ó Jesus, doçura dos corações e
poderosa suavidade das mentes, pelo azedume do vinagre e do fel que por nós
provastes, concedei-nos, na hora de nossa morte, receber dignamente o vosso
Corpo e Sangue, como remédio e consolação para nossas almas. Amém. — Pai-Nosso, Ave-Maria, Glória.
Oração IX. — Ó Jesus, virtude régia, júbilo
espiritual, lembrai-vos da angústia e da dor que padecestes quando, pelo
amargor da morte e os insultos dos judeus, com alta voz clamastes, abandonado
por Deus Pai: “Meu Deus, meu Deus, por que me abandonastes?” Por esta angústia
vos peço que nas nossas angústias não nos abandoneis, Senhor Deus nosso. Amém.
— Pai-Nosso, Ave-Maria, Glória.
Oração X. — Ó Jesus, Alfa e Ômega, vida e poder
em todo tempo, recordai-vos que desde o alto da cabeça até a planta do pé vos
mergulhastes por nós na água da Paixão.
Pela largura e extensão de vossas chagas, ensinai-me a mim,
afundado em muitos pecados, a guardar por verdadeira caridade a Lei que
promulgastes. — Pai-Nosso, Ave-Maria, Glória.
Oração XI. — Ó Jesus, abismo profundíssimo de
misericórdia, rogo-vos, pela profundidade de vossas chagas, que atravessaram a
medula de vossos ossos e vísceras, que me tireis da água de pecado em que estou
submerso e me escondais, no interior de vossas chagas, do rosto de vossa ira,
até que passe o vosso furor, Senhor. Amém. — Pai-Nosso, Ave-Maria, Glória.
Gravai, vo-lo peço, ó piedoso Jesus, todas as vossas chagas
no meu coração com o vosso preciosíssimo Sangue, para que nelas eu leia sempre
a vossa dor e morte e persevere constante até o fim em ação de graças. Amém.
— Pai-Nosso, Ave-Maria, Glória.
Oração XIII. — Ó Jesus, leão fortíssimo, Rei
imortal e invencível, lembrai-vos da dor que padecestes quando todas as forças
do vosso Coração e Corpo de todo se acabaram e, reclinando a cabeça, dissestes:
“Tudo está consumado”.
Por esta angústia e dor, tende misericórdia de mim, quando
minha alma, no momento do último suspiro, estiver vexada e conturbada. Amém.
— Pai-Nosso, Ave-Maria, Glória.
Oração XIV. — Ó Jesus, unigênito do altíssimo
Pai, esplendor e figura de sua substância, lembrai-vos da esforçada entrega com
que entregastes o espírito ao Pai, dizendo: “Pai, em tuas mãos entrego o meu
espírito” e, de Corpo lacerado, de Coração alquebrado, com grande clamor,
abertas as vísceras de vossa misericórdia para nos redimir, expirastes.
Por esta preciosíssima morte vos imploro, Rei dos santos,
que me fortaleçais para resistir ao diabo, ao mundo, à carne e ao sangue, a fim
de que, morto(a) para o mundo, eu viva para vós, e na hora suprema de minha
partida acolhei-me o espírito degredado e peregrino a retornar para vós. Amém.
— Pai-Nosso, Ave-Maria, Glória.
Oração XV. — Ó Jesus, videira verdadeira e fecunda,
lembrai-vos da abundante efusão do vosso Sangue, que vós, qual sumo arrancado
ao cacho, copiosamente derramastes quando, na cruz, calcastes sozinho o lagar,
e do vosso lado aberto pela lança do soldado nos propinastes Sangue e água, de
modo que nem uma só gota permanecesse em vós; e quando, enfim, fostes suspenso
no alto, qual um feixe de mirra, e vossa carne delicada se desfez, e o licor de
vossas vísceras se secou, e a medula de vossos ossos murchou.
Por esta vossa amaríssima Paixão e pela efusão do precioso
Sangue, piedoso Jesus, imploro-vos que recebais minha alma na agonia de minha
morte. Amém. — Pai-Nosso, Ave-Maria, Glória.
Conclusão. — Ó Senhor Jesus Cristo, Filho do
Deus vivo, acolhei esta oração com aquele amor excelentíssimo com que suportastes
todas as chagas do vosso santíssimo Corpo e tende misericórdia de mim, vosso
servo, e dai a todos os pecadores e a todos os fiéis, tanto vivos quanto
defuntos, misericórdia, graça, remissão e a vida eterna. Amém.
Notas
- A seguinte notitia foi publicada nas AAS 46 (1954) 64: “Em alguns lugares tem sido divulgado certo opúsculo intitulado ‘O segredo da felicidade. Quinze orações reveladas pelo Senhor a S. Brígida na igreja de São Paulo, em Roma’, Nice (e em outros lugares), publicado em várias línguas. Ora, como neste mesmo livro se afirma que a S. Brígida foram feitas por Deus certas promessas, de cuja origem sobrenatural não há evidência alguma, tenham os Ordinários de cada lugar o cuidado de não dar licença para que se vendam ou de novo se imprimam opúsculos ou escritos que contenham as mencionadas promessas. — Dado em Roma, nas dependências do Santo Ofício, no dia 28 jan. 1954. Mário Crovini, Notário da Suprema e Sacra Congregação do Santo Ofício.”
Oração extraída do Preces Latinae
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