O Leão e o Incenso Invisível

Era um início de tarde como outra qualquer, mas com cheiro de eternidade. Um daqueles dias em que o céu parece estar de vigília, como uma capela suspensa sobre o mundo. O povo, feito de barro e esperança, não sabia ao certo o que esperar, mas sabia rezar. E rezou. Rezou com o corpo cansado e a alma em brasas. Rezou como quem implora um milagre antigo, desses que já nem se pedem mais porque parecem coisa de Bíblia e não de noticiário.
E então, veio a fumaça.
Não a fumaça vulgar das
fábricas ou dos incêndios que o homem acende com orgulho e destruição. Era
outra. Uma fumaça santa, feita de espera, tradição e incenso invisível. Subia
leve, como suspiro de anjo, até que do Céu, o Sopro eterno soprou — e desceu um
Leão.
Mas não era desses de
circo ou escudo de time. Não era feroz de garras, mas feroz de fé. Manso como o
Cordeiro, mas com os olhos firmes como os de um rei que sabe o peso da coroa.
Era um Leão humano — americano e peruano — e de uma só missão: ser pai num
mundo órfão.
Ali estava ele, meio
improvável, meio óbvio, como as coisas de Deus. Vinha sem grito, sem
propaganda, sem hashtags. Mas bastava abrir a boca e o Céu soprava de novo,
agora pelas palavras. Quando falava do Alto, parecia que o mundo todo tomava
fôlego. Quando rezava em latim, até o chão se ajoelhava em reverência. Ninguém
entendia tudo, mas todo mundo sentia algo. Porque há palavras que não são para
serem traduzidas — são para serem contempladas.
Chamaram-no de Leão. Não
por rugir, mas por proteger. Pastor de Roma, sim, mas também do Brasil
profundo, daquele Sertão que ainda sabe o que é joelho no chão e terço no
bolso. Gente que, como ele, não busca aplausos, mas salvação. E no meio da
selva da internet, onde todo mundo quer ser ouvido, ele reinava no silêncio. Um
silêncio que cura, que educa, que desconcerta. Porque, veja, hoje o escândalo é
alguém ser santo.
Não se dobrou ao
algoritmo, nem ao espírito do tempo. E por isso mesmo cativou milhões. Não
pregou muros, mas limites — e essa é uma diferença que só os sábios entendem.
Limitou o ego, limitou o barulho, limitou a pressa. Plantou disciplina como
quem planta oliveiras: sabendo que talvez não colha, mas confiante de que
alguém colherá.
Nos bastidores do trono
de Pedro, onde muitos querem o palco, ele preferiu o sacrário. Guardado por
Nossa Senhora das Dores e amparado por São José, caminhava como quem sabe que
ser Papa não é estar no topo, mas no último lugar da fila. Ali onde se ouve melhor
o clamor do povo.
E assim ele vai, como
quem não quer nada, mas traz tudo.
O mundo ainda se debate,
se distrai, se destrói. Mas lá no fundo, algo mudou desde aquele dia da fumaça.
Um Leão manso entrou no cenário. E com ele, entrou de novo a possibilidade do
sagrado. Entrou de novo a esperança que canta em latim e chora em português. E
no meio do caos, um povo se pôs de pé. Porque onde há um pastor de verdade, há
sempre um rebanho disposto a resistir.
E o mundo, que já tinha
esquecido como se reza... agora lembra.
🦁
Amém.
Por seu Irmão Carmelita Secular da Antiga Observância B.
Nota ao leitor:
Esta crônica nasceu ao calor das palavras cantadas na composição de Bernardo Pires Küster “Modão do Leão” — uma canção que mistura fé, poesia e profecia num só sopro de esperança. Cada linha aqui escrita é sombra e eco desse canto que ressoa alto nos corações atentos ao tempo e ao sagrado.
▶️ Ouça a canção: