Quando o Céu Aprende a Gotejar
Ainda está escuro. O mundo boceja. A cidade dorme com a
televisão ligada e a alma desligada. E a Igreja — velha senhora sábia — acende
uma vela. Só uma. Porque quem espera o Eterno não precisa de holofote.
É Advento. Tempo em que Deus pede silêncio para poder falar.
“Rorate caeli desuper.”
Não é frase bonita. É grito antigo. É chão rachado olhando
pro alto. É a humanidade cansada de si mesma dizendo: “Chega de nós. Desce
Tu.”
O orvalho não cai com estrondo. Não faz barulho. Não
viraliza. Ele simplesmente cai. De madrugada. Quando ninguém está filmando. E é
assim que Deus gosta de vir: discreto, fiel, inevitável.
A Missa Rorate é uma aula teológica sem slides. Ali se
aprende que a salvação não nasce do nosso esforço histérico, mas da paciência
obediente. Maria não força o céu. Ela espera. E porque espera, concebe. Eis o
escândalo: o mundo é salvo não por quem corre, mas por quem consente.
O Advento moderno quer atalhos. Luz piscando em novembro,
Papai Noel antes do profeta Isaías, Natal sem espera — logo, sem mistério. Mas
a tradição, essa velha mestra impopular, insiste: primeiro o vazio, depois a
plenitude. Primeiro a noite, depois a aurora.
Rorate é teologia destilada em oração. É dizer que o céu não
é arrancado, é implorado. Que Cristo não é produto, é dom. Que a Encarnação não
começa em Belém, mas no desejo ardente de um povo que ainda sabe ajoelhar.
Há algo profundamente contracultural em esperar. Esperar
purifica. Esperar dói. Esperar educa o coração a reconhecer Deus quando Ele
chega — pequeno, envolto em silêncio, fora dos esquemas.
Quem reza o Rorate aprende a linguagem do orvalho: pouco,
mas suficiente; simples, mas vital; invisível, mas transformador. Aprende que
Deus não invade, Ele visita. E só encontra casa quem deixou a porta aberta.
No fim, o Advento não pergunta se estamos prontos para o
Natal. Pergunta se ainda somos capazes de desejar o Salvador. Porque só quem
deseja, reconhece. E só quem espera, recebe.
Que o céu volte a gotejar.
E que a terra — seca, cansada, fiel — volte a florescer.
Por seu Irmão Carmelita Secular da Antiga Observância B