Entre o Altar e a Praça: Quando o Evangelho Vira Manifesto


Diário de um Católico na Contrarrevolução — Parte 22

O Novo Cântico da Igreja de Rua

Há uma nova liturgia silenciosa se espalhando nas paróquias.

Não é a do Missal de São Pio V, mas a da militância de pano e megafone.

O turíbulo cedeu lugar à faixa; o incenso, ao slogan.

E o que era o altar de sacrifício virou, em muitos lugares, um palco de causas humanas — sinceras, mas rasas.

De repente, parece que a fé que movia montanhas virou um programa social.

A Missa, antes um vislumbre do Céu, tornou-se um comício piedoso, cheio de palavras inflamadas, mas de joelhos ausentes.

E o Cristo que nos salvou do pecado agora aparece reconfigurado — não mais o Redentor do mundo, mas o “companheiro dos pobres”, o “profeta da justiça social”.

Sim, o modernismo é esperto.

Não chega como negação, mas como reinterpretação.

Não destrói o templo — o reforma com tijolos de boas intenções.

Mas, como todo arquiteto sabe, basta mudar o alicerce para o edifício ruir.

A Caridade sem Céu e o Evangelho horizontal

Nos dizem que a Igreja precisa “voltar aos pobres”, como se em algum momento ela tivesse partido deles.

Mas a ironia é que essa “volta” não é espiritual — é sociológica.

O pobre, para o catolicismo moderno, deixou de ser o sofredor de alma e corpo que clama por Deus, e virou símbolo político, bandeira, estatística.

Não o pobre de espírito — o pobre de pauta.

O problema não é amar os pobres.

O problema é reduzir o Evangelho a isso.

Transformar a caridade sobrenatural — virtude que brota do amor de Deus — numa campanha de sensibilização.

Como se o Reino dos Céus fosse uma meta dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável.

Leão XIII, em Rerum Novarum, alertou que a desigualdade faz parte da ordem providencial — não como injustiça, mas como convite à caridade.

Pio X, em Notre Charge Apostolique, advertiu que confundir fraternidade com igualitarismo é trocar a cruz por um comitê.

E Pio XII, sempre com precisão germânica, lembrou que a missão da Igreja é salvar almas — e disso virá toda a restauração do mundo.

Mas hoje, os púlpitos falam de políticas públicas e omitem o pecado.

Pregam contra o “capitalismo selvagem”, mas silenciam sobre o aborto.

Denunciam “estruturas de injustiça”, mas esquecem a estrutura da graça.

Falam de fraternidade universal, mas já não mencionam o Inferno — talvez por medo de parecer intolerante.

E enquanto os discursos se inflamam, o turíbulo esfria.

As igrejas se esvaziam.

A Missa Tridentina, onde o Céu toca a Terra, é relegada a guetos, tratada como relíquia de estetas — quando, na verdade, é o coração pulsante da fé.

Porque é nela que a Igreja lembra quem é: esposa, não ONG; mãe, não mediadora de debates sociais.

As causas que substituíram os Credos

Passe em qualquer assembleia pastoral moderna e verá:
fala-se em “inclusão”, “escuta”, “acompanhamento”, “diálogo inter-religioso”.

Bonito, sim. Mas experimente dizer “pecado”, “inferno”, “graça santificante”, “sacrifício expiatório”.

O clima pesa. O ar muda. O “espírito do Concílio” se remexe na cadeira.

Vi um sacerdote — bom homem, piedoso — explicar que o milagre da multiplicação dos pães “não foi milagre”, mas “partilha”.

O milagre, dizia ele, foi “as pessoas abrirem suas mochilas”.

E eu, ali sentado, pensei: então Judas também partilhou, não?

Quando a fé vira metáfora, o pão deixa de ser Corpo — e o altar, mesa de reunião.

Outro dia, uma pastoral inteira foi dedicada à “ecologia integral”.

Ninguém mencionou a Confissão.

Mas houve oficina de compostagem.

Nada contra o cuidado da casa comum — mas se a casa da alma continua em ruínas, o que adianta separar o lixo?

Conclusão: entre a Revolução e a Redenção

A contrarrevolução não é nostalgia.

É fidelidade.

Não queremos voltar ao passado, mas voltar ao alto.

Porque a Igreja não começou em Medellín, mas no Calvário.

E seu projeto social é o mesmo desde então: salvar o homem, libertando-o primeiro do pecado — e, se possível, também da miséria.

A opção preferencial pelos pobres é bela quando é cristã: quando o pobre é amado por amor a Cristo, não usado em nome de Cristo.

Quando a esmola vem com oração, e não com slogan.

Quando o pão é dado com a bênção, não em troca de aplausos.

O modernismo prometeu atualizar o Evangelho; no fim, apenas o diluiu.

Mas os santos — sempre eles — nos mostram o caminho inverso: Santa Isabel da Hungria, que servia os pobres de joelhos.

São Vicente de Paulo, que via em cada mendigo o rosto do Crucificado.

E os monges e mártires que deram tudo, sem transformar a caridade em campanha.

É tempo de lembrar: a Igreja que alimenta corpos deve antes saciar almas.

A revolução pode ser tentadora, mas só a contrarrevolução é redentora. Porque ela começa onde o mundo termina — aos pés da Cruz.

Por um Católico consciente e atento ao cenário eclesial do Brasil e do Mundo.