O Casulo da Alma
Há uma hora secreta no tempo da alma, em que o mundo se cala e o Espírito sussurra. Uma hora em que o velho homem, cansado de seus próprios ruídos, pressente que é tempo de morrer para nascer de novo. Santa Teresa de Jesus, mãe dos espirituais, contemplativa de olhar afiado, nos deu uma imagem que não é apenas bela, é esmagadoramente real: a metamorfose do bicho-da-seda.
A alma, nesse nosso estado miserável, é como uma semente
seca, adormecida nos celeiros da graça. Parece viva, mas ainda não passou pelo
calor. E o calor, ah... não é ternura de colo, mas labareda do Espírito, que
começa a cutucar, a inquietar, a sacudir a poeira do coração. É aí que o bicho
desperta. Lentamente, se arrasta, começa a mastigar as folhas das amoreiras – a
Palavra, os sacramentos, a confissão fiel, a penitência silenciosa, as
madrugadas frias de oração... São folhas ásperas, amargas muitas vezes, mas que
nutrem o que ainda está em esboço.
E então o bicho começa sua obra. Trabalha em silêncio,
fiando a seda com a boca – porque é com o verbo que a alma tece sua morada. Com
a boca que louva, que reza, que canta salmos nas noites escuras, que murmura “Fiat”
entre lágrimas. Vai tecendo o casulo, fio após fio, renúncia após renúncia. Não
é obra grandiosa aos olhos do mundo – é só um verme se enroscando, se
escondendo. Mas aos olhos de Deus é palácio.
E o mais misterioso: a casa que a alma tece é o próprio
Cristo. Não algo sobre Cristo, ou para Ele. Mas nele. Porque quem se une
a Ele pelo amor se enrosca no próprio Coração de Deus. E ali, no interior desse
casulo, a alma morre. Morre para si, para as vaidades, para os sonhos baratos,
para os afetos desordenados, para a vontade que sempre quis mandar. Morre. E
quem não está disposto a morrer, nunca saberá o que é nascer.
Mas então... então acontece o milagre: do que parecia
sepultado, sai uma mariposinha branca. A alma transformada. Já não rasteja;
voa. Já não deseja pouco; quer tudo. Já não serve a Deus como obrigação, mas
como paixão. O que antes era impossível – penitência, solidão, desprendimento –
agora é desejo ardente. Ela já provou de Deus. E tudo o mais perde o gosto.
Agora, nada a contenta senão voar cada vez mais alto. E onde pousará? Em lugar
nenhum deste mundo. Porque, tendo pousado em Deus, tudo o mais se tornou chão
seco demais.
Essa borboleta inquieta que não sabe mais andar passo a
passo, é o retrato da alma unida. Já não mede esforços, não calcula
recompensas. Vive com sede, mas é uma sede santa. Sofre, mas é um sofrimento
doce. Chora, mas são lágrimas de amor. Quer morrer mil mortes, se for por amor
de Cristo. E nada, nada do que antes a prendia tem mais poder sobre ela.
Esta é a santidade. Não é estrelato eclesial, nem vitrine de
virtudes. É desaparecer como bicho feio, para ressuscitar como mariposa branca.
É tecer em silêncio o casulo da cruz, para depois ser gloriosamente sugado pela
força da Ressurreição.
E como diz nossa Madre, ainda virá mais. Porque o voo da
alma não tem teto. A borboleta também morrerá – e então será Cristo mesmo.
É tempo de fiar. De morrer. De voar.
É tempo de deixar Deus ser tudo.
Por seu Irmão Carmelita Secular da Antiga Observância B.