Crônica de um Leão no Monte de Miguel

“Deus ama a todos vocês, e o mal não prevalecerá!”

Na alvorada em que os sinos da Cristandade despertaram com uma força esquecida, o céu parecia mais perto da terra. O Espírito soprava — suave, mas determinado — como o passo de um Monge sobre pedras antigas. No trono de Pedro, pela primeira vez, sentou-se um filho de Santo Agostinho. E ao tomar o nome de Leão XIV, ele rugiu não com estrondo, mas com mansidão, como quem sabe que a verdadeira força não precisa gritar. E rugiu num dia que os anjos não esquecem: o dia da Aparição de São Miguel no Monte Gargano, 8 de maio.

Coincidência? Seria ingenuidade dizer isso. Foi liturgia celeste.

E então ele falou. Sim, ele falou — não com a retórica vazia dos que agradam a todos, mas com a voz do Bom Pastor. Seu primeiro gesto foi oferecer paz: “A paz esteja com vocês!” — não uma paz diplomática, envernizada, feita de conchavos e concessões, mas uma paz desarmada e, por isso mesmo, desarmante. Uma paz que vem de Cristo Ressuscitado, não das resoluções da ONU. Uma paz que rasga a alma e a refaz no amor de Deus.

E foi ali, diante do mundo, que o novo Papa — esse Leão de túnica agostiniana — levantou o olhar e disse com firmeza suave: “Deus ama a todos vocês, e o mal não prevalecerá!” Era como ver São Miguel de novo no Monte, espada em riste, mas agora com um báculo. Era como ouvir Santo Agostinho repetir das muralhas de Hipona: “Com vocês sou cristão, para vocês sou bispo.”

Leão XIV não prometeu revoluções nem inovações. Prometeu caminhar. Sim, caminhar — como quem faz peregrinação rumo à pátria celeste. E agradeceu ao Papa Francisco, aquele “cuja voz fraca, mas corajosa”, ainda ecoa nas pedras de Roma. Mas, atenção: este novo Papa não é uma repetição. É sequência. É consequência. É fruto maduro de uma árvore que voltou a florescer mesmo em tempos de inverno espiritual.

Sua eleição num dia tão profético não foi acaso — foi sinal. A voz que surgiu naquela sacada não foi a do gestor de uma ONG espiritual, mas a de um pastor com cheiro de Eternidade. E mesmo ao falar de pontes, diálogos, encontros — temas tão gastos por certos setores da Igreja —, ele o fez como quem realmente crê na ponte da Cruz, no diálogo entre o Verbo e a carne, no encontro que transforma e não que dilui.

Os olhos dos fiéis, tão acostumados à morna ambiguidade, reconheceram nele algo raro: clareza. Não arrogância, mas identidade. Não dureza, mas raiz.

E os sinais se multiplicaram. Os padres fiéis — esquecidos, marginalizados, empurrados às periferias da própria Igreja — sentiram, por um segundo, que Roma lembrava deles. O pó das batinas guardadas começou a se mover. Os altares voltados para Deus tremeram levemente, como se os anjos estivessem reorganizando o espaço litúrgico do cosmos.

Leão XIV, o primeiro Papa agostiniano, eleito no dia do Arcanjo Miguel. A coincidência é poética demais para não ser Providência. Não foi apenas uma eleição. Foi um chamado às armas espirituais. Um toque de trombeta que não conclama à guerra de ódio, mas à Milícia da Verdade.

A Igreja ainda é militante. O dragão ainda ruge. Mas desta vez, há um Leão no trono. E com ele, talvez, uma chance real de que as ruínas sejam reconstruídas com pedras vivas — uma por uma, com lágrimas, com sangue, com fé.

Por seu Irmão Carmelita Secular da Antiga Observância B.