Venite ad me omnes, qui laboratis et onerati estis; et
ego reficiam Vos – “Vinde a mim todos os que estais cansados e
carregados e eu vos aliviarei” (Mt 11, 28)
Sumário. Nesta terra não é permitido a
todos os súditos falar ao príncipe. O mais que os pobres podem esperar é
falar-lhe por meio de terceira pessoa. Não é assim com o Rei do céu, que está
no Santíssimo Sacramento. Com este pode falar quem o deseje, e sem acanhamento.
Procuremos, portanto, ir muitas vezes à sua audiência e expor-Lhe todas as nossas
necessidades. Peçamos-Lhe particularmente que desligue o nosso coração de todas
as coisas terrestres e o encha do seu santo amor.
I. Dizia Santa Teresa que nesta terra não é
permitido a todos os súditos falar a seu príncipe. O mais que os pobres podem
esperar é falhar-lhe por meio de terceira pessoa. Mas para conversar convosco,
ó Rei do céu, não se precisa de terceira pessoa; quem quiser, pode achar-Vos no
Santíssimo Sacramento, e falar-Vos à vontade e sem acanhamento. Por isso a
mesma Santa dizia que Jesus Cristo velou a sua majestade sob as aparências do
pão, para nos inspirar mais confiança e nos tirar todo o temor de nos
aproximarmos d’Ele.
Ah! Parece que lá dos altares Jesus ainda cada dia exclama e
diz: Venite ad me omnes, qui laboratis et onerati estis, et ego
reficiam vos ― “Vinde a mim todos os que estais cansados e carregados, e eu vos
aliviarei”. Vinde a mim, vós pobres, vinde enfermos, vinde atribulados,
vinde justos e pecadores; em mim achareis o remédio para todos os vossos males
e aflições. O que Jesus Cristo deseja é consolar a quem a Ele recorre.
Permanece presente sobre os altares tanto de dia como de noite para ser
acessível a todos e comunicar a todos as suas graças.
Por isso os santos achavam na terra tão grande satisfação em
estar na presença de Jesus sacramentado, que os dias e noites se lhes
afiguravam como instantes. A condessa de Feria, depois de entrada na ordem de
Santa Clara, nunca se fartava de ficar no coro a visitar o Santíssimo
Sacramento. Perguntada uma vez o que fazia tanto tempo diante do santo
Tabernáculo, respondeu que eram tão grandes as delícias que nisso gozava, que
queria ficar ali toda a eternidade. ― São João Francisco Regis, depois de
passar o dia no confessionário ou no púlpito, passava as noites na igreja, e
achando-a alguma vez fechada, deixava-se ficar à porta exposto ao frio e ao
vento, para ao menos de longe fazer companhia a seu amado Senhor. São Felipe
Neri exclamava à vista do Santíssimo Sacramento:
“Eis aí o meu amor! Eis aí todo o meu amor!”
Ah! Se Jesus Cristo fosse também todo o nosso amor, a nós
também os dias e noites passadas na sua presença se nos afigurariam como
instantes!
II. Em todas as vossas necessidades
particulares, como no tomar ou dar conselho, nos perigos, nas aflições,
enfermidades e tentações, especialmente nas contra a pureza, recorrei sempre a
Jesus sacramentado, e não podendo fazê-lo de corpo, fazei-o pelo menos em
espírito. Achando-vos diante do santo Tabernáculo, dizei muitas vezes com São
Felipe Neri: “Eis aí o meu amor! Eis aí todo o meu amor!”
Sim, meu amado Redentor, só a Vós quero amar; quero que
sejais o único amor de minha alma. Sinto-me morrer de dor à lembrança de ter
outrora amado as criaturas e minhas satisfações próprias mais que a Vós, e de
ter virado as costas a Vós, ó Bem infinito. Vós porém, para não me verdes
perecer, me suportastes com tanta paciência, e em vez de me punirdes, me
feristes o coração com tantas setas de amor, de sorte que não pude mais
resistir às vossas finezas e me dei todo a Vós. Vejo que me quereis
inteiramente para Vós. Mas já que o quereis, fazei-o; porquanto a Vós pertence
fazer que assim seja.
Livrai-me de todo o apego à terra e a mim mesmo, e fazei com
que eu procure agradar somente a Vós, não pense senão em Vós, não fale senão de
Vós, e não deseje senão arder de amor para convosco, viver e morrer por Vós. Ó
amor de meu Jesus, vem e apodera-te de todo o meu coração e expele dele todo o
amor que não é para Deus. Amo-Vos, ó Jesus sacramentado, amo-Vos, minha vida,
meu tesouro, meu amor, meu tudo.
― Ó Maria, minha esperança, rogai por mim e dai-me ser todo
de Jesus.
(LIGÓRIO, Afonso
Maria de. Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo I: Desde o
Primeiro Domingo do Advento até a Semana Santa Inclusive. Friburgo: Herder
& Cia, 1921, p. 327-329)
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